A porta entreaberta, o quarto escuro, a não ser pelo filete de luz que vinha do corredor que iluminava seu rosto e seu sorriso que escapava hora sim, hora não. Um silêncio envolvente que fazia nossa respiração (carregada de vontades) parecer uma orquestra terrivelmente desafinada de tão alta. Por horas, a terra deteve seu percurso normal, não girava nada existia atrás da janela gotejada pela garoa forte, que nós nem sequer ouvimos. Nada existiu durante algumas horas. Só o toque. E o que mais precisava existir? Os medos escaparam por de baixo da cama, e só voltaram ao meu compasso quando o despertador tocou. Despertar pra que? Sendo que a vida só é bem vivida quando esquecemos de sua realidade irreversível. Só os segundos de absoluto devaneio despertam profundamente, algo extraordinário e inatingível. Quanto menos eu exista, melhor era viver.
Quem nunca teve uma sensação tão maravilhosa que no dia seguinte jurou ser apenas imaginação? Como se não fizesse sentindo tanto prazer. Não fosse real, nunca, nem voltaria a ser.
Volto com todas as malas sem nenhum esquecimento, ao mundo de sensações reais (tão reais que nem se pode acreditar) enfim.. Não se pode eternizar nada, nem o real nem o imaginário, nem o deleite nem o assustador, porque assim todas essas sensações passam a inexistir. E a última coisa que quero é me tornar real ou imaginária demais.